Achei que estava atrasado. Era uma quarta-feira de agosto. Uma semana já se passou desde toda aquela confusão. Não estava nem perto da hora de ir para o colégio. Levanto mesmo assim. Aproveito para tomar um banho sem ter que correr. Café da manhã? Café e torradas com manteiga. Totalmente o contrário do que ela escolheria... Chá e torradas com geleia. Tomara que tenha acertado dessa vez. A única coisa que tínhamos realmente em como era a torrada. Mas os opostos se atraem. 

Ela pode não assumir, mas ela sabe que eu sei tudo sobre ela : Saudades de São Paulo, a mãe dela, dificuldade em Matemática, problemas com coelhos, amor por desenhos animados, prefere ficar longe dos livros... Sou totalmente o contrário : gosto daqui, apesar de ter saído agora do Rio, filho único, só não gosto de Português, tenho um coelho, preferência por filmes de terror e amor por livros. Mas tudo nunca deu tão certo.

Sento no sofá e como o tempo estava sobrando, fico um pouco no computador. Nada de bom no facebook. Talvez algumas duas fotos dela, mas tirando isso, nada. Levanto e coloco o tênis. Saio de casa e vou caminhando. Não correndo, como estou acostumado. Caminhando mesmo. Faltam quinze minutos para sete horas. Quanto tempo eu fiquei olhando meu twitter? Essa é a primeira noite que consigo dormir, então, não estou com tanto sono. 

A Carol está do outro lado da rua, falando com a Duda. Ela não esperou a Clarice? Deve estar esperando, as duas estão paradas perto da padaria. Atravesso com cuidado para elas não me perceberem. As duas me odeiam depois do fim do namoro com a Clarice. Continuo andando. Nenhum sinal do Daniel. Deve ter acordado agora. Perto da escola tem uma garota andando. Mas ainda não consigo reconhecer. Ando um pouco mais rápido. É exatamente quem eu imaginava.

Do mesmo jeito que nos outros dias. Óculos, cabelo ruivo solto, com o vento atrapalhando a visão, por causa da franja. Uma Coca-Cola na mão e um chiclete na boca. Ela sempre fez combinações estranhas. Corro para alcançá-la, mas mesmo andando devagar, ela está longe. Não conseguiu dormir, imagino. Ela parece atenta ao barulho. O som dos meus passos, imagino. Então grito para ela : 

"Clarice! Clarice!"

Ela vira para mim. E sorri.

"Achei que nunca mais te veria"

Então, ela se apoia no meu ombro e me abraça. Eu faço o mesmo.